Tenho
um gosto esquisito pela imprevisibilidade da vida. É verdade que a gente sempre
tem roteiros e agendas, mas nunca tive nenhuma garantia de que os
acontecimentos cumpririam o programa. É aí que mora um desafio gostoso:
escolher entre sentar-se, reclamar e chorar ou botar a cabeça para funcionar e
encontrar a forma de voltar a vida para os trilhos.
Vivo
isso em períodos de mudança. E gosto. Não que as mudanças não me assustem, mas
imagina que castigo ser a mesma coisa, no mesmo lugar a vida inteira. Não
mesmo! Prefiro o movimento. E cá estou diante de uma mudança; dessas mais
simples, ainda de proporções indefinidas. Talvez seja só de um apartamento para
outro, talvez não passe de uma substituição de pessoas que moram no atual. De
uma forma ou de outra, haverá reconfiguração.
Sei
é que o que a mudança tem de desafio-encantador, de novas e inúmeras
possibilidades, ela também tem de desconfortável. De repente, a casa arrumada
de acordo com a cara dos moradores é desfeita. É um tal de desmonta daqui,
embala dali... E as coisas feias da casa, antes maquiadas ou escondidas, agora
são escancaradas. Já reparou? Mudanças revelam manias e hábitos estranhos, por
vezes cultivados tão carinhosamente... Mas, sejamos sinceros, é uma ótima
oportunidade de descartar entulhos e coisas que insistimos em guardar, mesmo
não tendo mais utilidade. Ou, o que é melhor, podemos descobrir em nossos
guardados objetos que ainda serão úteis para outras pessoas.
É
um tempo de a gente se desapegar de coisas insignificantes, reaprendendo a
valorizar o que é de fato importante. De saber que é perfeitamente possível
viver bem sem todas as quinquilharias que julgamos indispensáveis. Um bom tempo
para se livrar dos excessos, para que somente permaneça a essência.
E
confesso: é libertador olhar a casa vazia! Oportunidade de recomeçar. Página em
branco, pronta para receber a história que eu quiser contar. Um convite ao
exercício da criatividade que ás vezes se esconde. É que sentada no chão, no
centro da sala sem móveis, me vem à memória a história da Criação, lá no
princípio, quando somente havia o caos e o nada, e a partir daí, Deus fez
surgir esse mundão todo! Inspirador, no mínimo.
Vazio
propício para refletir sobre o que queremos que seja a casa nova, quais as
pessoas serão bem-vindas, que energias desejamos atrair... Gosto mais ainda que
isso aconteça agora, quando é início do ano e a gente tem bom estoque de ânimo
e um monte de planos ainda frescos, acentuando a cara de recomeço.
Guardadas
as proporções inevitáveis de desconfortos e desgastes, mudança é um tempo bom
para rever nossa conduta e reorganizar nosso mundo, colocando coisas e pessoas
em seus devidos lugares dentro dele. E, por que não? É tempo também de compartilhar
a vida com outras pessoas, com gente diferente.
É
por isso que aproveito a mudança para dizer algo aos meus amigos; aos antigos,
fiéis e sempre presentes: faz tempo que vocês são uma espécie de âncora,
oferecendo estabilidade pra que eu sempre atravesse períodos turbulentos assim,
com leveza, conseguindo enxergar o mundo ainda em cores. Aos recém-conquistados,
que fazem de cada encontro ou conversa uma deliciosa descoberta: vocês
despertam em mim a paixão pelo imprevisível. A todos os meus amigos: assim como
na minha vida, vocês são bem-vindos à nossa casa nova (ou nova casa, sei lá!).
E quando vierem, brindaremos em celebração à novidade que pode ser cada dia!
Quem tem amigos tem um tesouro. E quem tem amigos novos está livre do castigo
de passar a vida inteira se refletindo em espelhos velhos!